27.5.08

quando aconteço

o bom de ser ator é poder decidir o momento certo de chorar. o efeito da lágrima. como agora. agora, estou chorando, porque quero e consegui acessar um sentimento de extrema angústia embebida de desolação, consegui revirar alguns machucadinhos que já cicatrizaram, mas minhas unhas estão grandes, cheias de vermes e bactérias, minhas unhas cutucaram meus machucadinhos e agora, ai! estou chorando.
logo depois, penso em como vou decidir o que é melhor para mim: não ter casa ou viver só em seu interior. No caso primeiro, o passo é instável, a cifra é a palavra 'qualquer'. no primeiro caso, lido com o qualquer que me chega e necessariamente devo responder 'tudo bem', está será minha reação para todas as coisas da vida. no segundo caso, tudo muda e tudo é mudo, apesar de haver inúmeras vozes girando ao meu redor. ou melhor, tais vozes dilaceram a mim e às paredes do meu quarto, do meu pequeno quarto em que vivo, em que posso agrupar tudo que sou, tudo que tenho, sou tudo que tenho e isso é tudo, isso me basta, isso me bastará, nada mais servirá para nada mais.
mas não. não quero. desculpe-me, você não está me entendendo. Olhe para mim.
Veja o quão carente eu sou. Perceba. Por favor, faça o que eu pedir. Só desta vez. Da próxima vez será a sua vez, a sua chance de tentar jogar com a sua lembrança, ou melhor, com a sua alienação.
minhas lembranças me isolam de tudo aquilo que jaz agora.
os olhos, quando bóiam, percebem todos aqueles objetos ao redor que jazem. Não sei ao certo se os meus bóiam ou nadam, mas sei que partilham um outro meio, a água, que escorre bem no corpo, o ressuscitando. quando tomo banho, suspiro e é o alívio. porque preciso de água para o alívio? Não é bem assim, assim não se resolve o mistério. (estamos no meio de um enigma. por favor, acompanhe. tiros de pistola. origem: a viatura policial que se encontra diante de nós. agachamo-nos?).
Não preciso e nem quero falar do cigarro. O cigarro me irrita. Porque o cigarro é simplesmente o cúmulo do falso alívio. O cigarro é um fantasma. Ele não está nas suas mãos, ele não existe. O cigarro dita o ritmo da respiração, do soprar, do inspirar e expirar, o cigarro é a câmera ligada, algo que te capta e te joga (sem nem mesmo você reparar) para um além. é porque é isso: a boa e terceira idosa moralidade mais moral de todos sugere que sejamos todos consequentes. Consequência, é só o que eu te peço. Não posso. Eu te peço e eu não posso. Minha imagem filmada é como meu inconsciente: ambos eu não controlo. não sei para onde minha imagem pode estar neste momento, qual é sua direção, seu volume, seu estado, sua temperatura, sua pressão, seu humor, sua altura, seu peso, sua densidade, sua largura, seu comprimento, não posso saber nada disso. Sou como corno, sou o último a saber sempre. Você vê antes de mim: fato é que você me conscientiza. É você que me avisa. Então agora devo dizer (para finalizar): me diga aí você.

1 comentário:

Mariana Kaufman disse...

digo:

machucadinho que sara mas não cicatriza
machucadinho que cicatriza mais fere de novo...

e o nome, que nome?