26.12.07

não precisar dormir.

- é a terceira vez que te acordo.
- é a terceira vez que te digo que não quero acordar.
- porque devo deixar dormir?
- porque não deve me deixar dormir?
- porque estou acordado.
- porque não dorme?
- porque não quero dormir.
- porque não consegue dormir?
- porque não tenho prática de dormir.
- porque não consegue dormir?
- porque não consigo dormir.
- porque então não esquece de dormir?
- porque você dorme.
- quer que eu pare de dormir agora?
- quero esquecer de dormir agora.
- o que eu posso fazer por você?
- troque de lugar comigo.
- troco de lugar com você para que eu possa não dormir assim como você?
- sim, ponha-se no meu lugar.
- você se colocará no meu, cero?
- certo. vai ser assim.
- está bem. está feito. eu agora não posso mais dormir.
- e eu durmo.
- o que sente?
- o que nunca senti antes.
- está dormindo já?
- ainda não. você não deixa. mas sinto que a qualquer momento irei dormir.
- e eu?
- você não dorme.
- porque?
- porque escolheu não dormir.
- eu não escolhi isso.
- escolheu sim.
- não escolhi. escolhi trocar de lugar com você para que você possa dormir.
- já estou dormindo. por favor, não atrapalhe.
- você não pode me deixar aqui.
- porque não?
- porque será tudo diferente. para mim nada irá mudar. já você irá dormir e acordar. você tem direito a pausas. eu não. não está certo isso.
- não está justo isso.
- se eu sou igual a você, tudo deve acontecer a nós dois do mesmo modo.
- somos iguais.
- então devemos ser iguais.
- Se eu durmo, você não dorme.
- Se eu não durmo, você dorme.
- Não está certo isso.
- Devemos revezar. Já trocamos. Agora revezamos.
- Eu durmo por um tempo. Deixo de dormir por outro. Durmo por um tempo. Deixo de dormir por outro. E assim prossigo.
- Náo está bom.
- Ainda não está bom, eu sei.
- Como sabe? como pode estar tão certo? Você acha que tem esse direito?
- Tenho sim. Acho que tenho. Pelo menos isso.
- Porque então?
- Eu sei que ainda não está certo porque não podemos revezar se queremos viver juntos.
- Não entendo.
- Nós precisamos estar juntos. Se eu durmo e você não ou se você dorme e eu não estamos separados. Estamos juntos, mas separados. Precisamos nos unir.
- Vamos nos unir.
- Vamos.
- Como?
- Não sei.
- Já sei. Se, por acaso, deixássemos de dormir?
- Não seria a solução adequada.
- Posso saber porque?
- Pode.
- Porque?
- Porque estaríamos deixando de fazer algo. Não está certo isso. Devemos dormir e não dormir.
- É isso mesmo. Devemos dormir e não dormir. E digo mais: Devemos Dormir e não dormir unidos.
- Em uma mesma luta.
- Por uma única causa.
- Afinal somos iguais. Somos únicos.
- Não.
- O que?
- Não somos únicos. Somos dois. A causa é única.
- Nós dois somos únicos sendo dois.
- Aí sim.
- A causa é única entre nós dois.
- Estamos juntos nessa.
- Mas alguém aqui está trapasseando.
- Não diga.
- Digo. Alguém dorme sem a gente saber. Como pode?
- Que safadeza. Não podemos deixar mais que isso aconteça. Chega de tolerância. Devemos ter pulso forte.
- Precisamos descobrir quem é que nos frauda.
- Quem nos impede de prosseguir com a causa.
- Alguma idéia?
- Várias.
- Eu tenho uma melhor.
- Diga lá.
- Prontidão. Essa é a palavra.
- Trincheira. Essa é a palavra.
- Atenção.
- Cuidado.
- Precisão.
- Acuidade. Essa é a palavra.
- Esperteza.
- Agilidade.
- Reflexo.
- Inteligência.
- Sagacidade. Essa é a palavra.
- Está bem.
- Está bem.
- Escolhemos algumas.
- Um leque de palavras.
- Está pronto?
- Agora sim. Estou munido.
- No três.
- No dois.
- Um.
- Dois.
- Fim.
- É. o Fim.

fecha cortina.

uma peça de vida.

terceiro sinal. ele desliga o despertador. levanta da cama, arruma a cama, troca de roupa, acorda e vai ao banheiro. banheiro ele passa agua no rosto e escova os dentes. faz xixi, faz côcô. recebe o jornal e lê. não pode demorar muito tempo, pois afinal de contas seu dia tem apenas uma hora e meia. toca a música da rádio. momento de trabalhar.
ele mexe com mudanças. nada mais natural que precise trocar tudo de lugar. nesse momento retira a pia e a coloca no lugar da escrivaninha. a cadeira será a cama e a cama dá lugar ao chuveiro. o lugar do chuveiro será a cozinha, com frigobar e fogão de duas bocas. ele ainda não comeu. come pão. ele ainda não parou para fumar. cigarrete break. pensa no que ainda deve fazer. vai ao computador e responde e-mails. elabora uma planilha do dia. vai ao quadro de avisos e divide o dia em: coisas feitas e coisas a fazer.
escreve sobre o quadro tudo aquilo que já mudou no dia. e tudo o que ainda falta mudar. acabou a pausa. agora ele precisa continuar. manda imprimir a planilha. impressa, a planilha irá se juntar a outras planilhas que, juntas, compoem um quadro estatístico. olha o painel estatístico de seu próprio trabalho. uma caneta azul na mão esquerda e uma caneta-laser na mão direita. analisa os pontos de inflexão, os pontos críticos de suas próprias estatísticas. vê como deve agir a partir de então. percebe que os novos dados disponíveis revelam uma necessidade de transformação do seu modo de trabalhar. deve agora ser mais eficiente. deve realizar uma mudança mais ágil. por isso decide recomeçar pelo tapete.
Puxa o tapete de toda a casa. nada cai. tudo permanece onde está, sem tapete que agora é cortina. os quadros serão mesa e a mesa se tornará vaso. o vaso encontrará seu modo próprio de viver sendo telefone. o telefone não passará de um sofá. o sofá irá ocupar a função de televisor. e o televisor será transferido para o departamento de marketing. o departamento de recursos humanos será aumentado, de modo que o banheiro seja o dobro do que era antes. o quarto então fica pouco, mas suficiente para uma boa administração. os três departamentos deverão ser posicionados de modo que a comunicação e o deslocamento dele sejam otimizados.
sem que ele perceba, o dia está chegando ao fim. ele olha para tudo e registra visualmente a situação. fotos que ajudarão na reconstituição analítica a ser realizada daqui a um mês. ele finaliza seu trabalho por hoje.
tem fome e sede. encontra na geladeira pizza e coca-cola. come e bebe. bebe e come. vai ao banheiro, fuma um cigarro. vai ao computador e coloca uma música para dormir bem.
troca de roupa, prepara a cama. ajoelha e reza. diz boa-noite a si. a cortina fecha.
fim.

livre arbítrio

quando alguém retoma o ato de escolher o que vai seguir
e sugere que o próximo será isso.
algo como `agora preciso contornar a situação`
agora vão se os anéis
agora ficam os dedos
agora racha
agora não falha
quando eu digo que agora serei sempre sem nada a mais. quando preciso querer algum tipo de moderação.
tomo choque no joelho esquerdo.
e me pergunto: `como pude tomar choque assim no joelho esquerdo sem nem mesmo ter planejado isso?`

o sentimento de não saber parar

deixo a cama correndo e vou para o banheiro. lá, o que sempre acontece quando algo de ruim acontece dentro do corpo bem dentro que só percebo de fora. saio e procuro o lugar certo, tento encontrá-lo em meio a tanta desordem que me povoa e fico tateando todas as coisas perguntando: onde está, onde está?
no dia de hoje, a manhã já se instalou. no dia de ontem, a manhã já foi. amanhã não haverá manhãs possíveis pois todas as duas manhãs já foram. o que talvez reste de hoje, o que talvez reste de mim hoje é coisa que não sei. o estomago neste momento fala mais alto e corro para o banheiro para deixar vazar tudo que não sei mas que em mim não quer mais ficar.
afinal é isso que ocorre: quando se está em uma praia, olhando fixamente para o sol, eis que surge o homem de sempre que nunca mais havia aparecido. o homem de sempre então aparece em todo o seu encanto de desesperado, pleno de ironia irreconhecida, eis que assim se deixa surgir, assim aparece e diz a mim: manu.
eis que no eis, eis que surge, eis que no surge, eis que assim ele me oferece uma pequena dose de sua pílula recém adquirida e eu, por que haveria de recusar?
onde eu estava naquele momento é precisamente onde não estou agora. o fato é que colhi liquidos marrons que não soube gerenciar. deveria ter imaginado que seria preciso elaborar um plano de gestão, um planejamento amplo e estratégico que possibilitasse a mim, leia-se razão corporal, administrar os acontecimentos que rebolam ao meu redor.
o tal liquido precisa sair e disso eu não me lembrei. era preciso produzir um canal de fluxo vital-racional, um canal concreto, fazer do meu corpo-canal, deixa-lo aberto e sem maiores obstáculos, eu seria apenas isso, um meio de se deixar ser meio.
mas agora penso que o que devo fazer agora é simular um incêndio.
as fumaças que irão me ocupar farão sentido se expulsarem todo o meu líquido. penso então em fazer-me algo como puro vapor. mas para isso seria preciso dormir.
para dormir, seria necessário que a cama estivesse horizontalmente equilibrada mas verticalmente posicionada. dali eu começaria boiando. boiava, boiava até o momento crucial onde toda a caçada profunda começaria. seria necessário deixar de respirar. ou melhor, realizar uma economia do ar. para isso, ele, meu corpo, deveria obedecer aos anseios de mim.
só que dormir aconteceu pouco. a manhã de novo e dormir apareceu como lampada acesa que queima assim. se por acaso eu tropeçar em alguém e ele me perguntar se não dormi, respondo que sim, dormi sim mas dormi pouco. e não estou pronto pra outra. estou na mesma. estou ainda nele, no de sempre que as vezes sai sem eu querer mas que as vezes tomo sem saber porquê, porque as vezes o bom é justamente não saber o que se deve fazer para colocar em prática um concentrado modo de vida em que tudo se dirija ao dormir situado entre manhãs consecutivas que não devem conversar posto que duas manhãs juntas criam o sentimento de não saber parar.

17.12.07

venho

eu só venho aqui quando não posso formular nada de certo ou coerente.
eu venho aqui dizer que não sei.
quando eu venho, é só angústia.
é assim que eu venho aqui.

7.12.07

quando é o grande amor?

ainda hoje, nestes tórridos dias de tédio, existe o jogo denominado 'verdade e consequência'.
é justamente isso.
tudo deve fazer um sentido ou o outro.
é isso.
você deve escolher entre a verdade ou a consequência.
alguém ou algum motivo importante que justifique este instante.
é puro kid abelha.
e é assim.
eu sei que minha barriga avança neste meio quarto de vida.
sei que meu hálito não é uma brisa do verão.
sei que meu gozo desafina e que, mais ainda, meu corpo não dança, por pura incapacidade, conforme a música.
em resposta a isso, digo que não gosto dela.
mas, de fato, não é isso.
vejo todos os outros que não possuem problemas de tal natureza.
convivo com eles e sei que em todos, por mais que avançe a barriga ou qualquer outra coisa, eles não são eu.
eles não vivem a minha barriga.
mas eu dou me o direito de me enganar propositadamente.
e jogar 'verdade ou consequencia' é justamente o mais terrível e divertido engano. finjo pensar que ainda há causas e, por isso, consequências. finjo que acredito que verdades e, por isso, me assumo em mentiras.
pois o jogo pressupõe isso.
falar a verdade é, de fato, largar as mentiras.
e agir as consequências é possuir causas.
já que uma coisa não vive sem a outra.
e qual foi o final da história?
Ou melhor...
O que aconteceu de fato.
Alguém me cuspiu.
E vomitou o seu cuspe através de um beijo, que, na realidade, não era um beijo, era um atestado de superioridade.
ele agiu sobre mim, sem o mínimo senso de humor, como aquele

ser - deus - decidido - do - que - é - para - si.

e, fingiu tudo as custas da minha saliva.

e embaralhou meu rosto, desafiando-me para além do ridículo: aquele instante após a consciência do mal.

e o pior de tudo é que eu jamais pude brincar de 'verdade ou consequência'...
eu não falei a verdade e decidi falar o que já se falava entre os outros. resolvi agir as palavras de todo mundo. resolvi mentir para manter a verdade comum. quando, na verdade verdadeira, ei deveria rir do ser agressivo que me embaralhou o rosto. não só isso, como antes não teve nenhum pudor em afirmar que qualquer atitude que significasse aproximação seria uma guerrilha contra a qual ele deveria lutar.
eu nem era escudo. eu era muro. e o pior é que eu nem sei porque decidi ser muro.
por pura verdade daqueles que preferem mais saber de algo que não saber de si. para aqueles que sabem o que é faltar reconhecer. pois eu digo a verdade quando não sei me reconhecer.

e seu soubesse? saberia ter vivido um grande amor?

3.12.07

disperso

pelo que conseguisse ele iria muito além de tudo que passava por aqui.
não queria nada além do que sair dali. esse era o seu além. o além é fugir daqui já agora para onde nem ele sabe porque onde não importa o que importa mesmo é lugar não ser aqui e longe não é aqui.
para isso para sair daqui para ir longe ele tinha que conseguir algo. algo iria levá-lo longe, isso ele sabia.
o problema todo é saber encontrar algo que leve além.
esse era o enigma dele. como decifrá-lo?
pensando nas possibilidades, conclui que se se mexesse muito teria mais chances de estar sempre em algum lugar onde algo ele possa de fato encontrar.
mexeu-se. mexia-se muito.
movimentava-se ao ritmo da aceleração de um cometa.
dispersava-se geral.
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A guia.

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cansei disso aqui.

minhas secas fezes

toda noite, após ir ao banheiro, recolho as minhas fezes e as coloco para secar.

responda rápido ! Temos prazo!

sabe, pensei que poderíamos modificar o nosso projeto e fazer uma banda com levadas de jazz e ronck´n´roll.
já arranjei tudo. falei com o captador e ele adorou !
tive reunião com a designer, ela disse que não haveria problemas pois toda editoração eletrônica já estava pronta.
a assessora de marketing que apresentou alguns problemas... ela disse que já havia ligado pros jornais, revistas e sites comunicando a data da nossa estreia e que agora teria que religar para todos para poder remarcar...
disse que isso levaria muito tempo. mas concordou em fazer.
como troca, aumentei o salário dela.
bem, quanto aos atores, foi o seguinte:
o dudu, que fazia o conde aceitou virar tecladista.
a jandira, foi embora.
a janeth aceitou largar a empregada doméstica e ser cantora de jazz.
a rita ficou como backing.
o helinho é percussionista. ele já era percusionista...
e nós, querido, o que queremos ser?

preciso da resposta até sexta. sem falta.

beijinhos e fica bem!

:)